Ficções Corin Tellado. Ou não!
A vida dá-nos ficções. Ele não a contactava há 18 anos e enviou SMS a perguntar como está, na época covid.
Não exatamente. Há 3 anos, ela acometida por um complexo de culpa, telefonara-lhe de rompante, junto ao mar bravio, fustigada por uma nortada fria, de que se protegia com um ponderado casaco, dali mesmo lhe pedira perdão. Pretendia assim remediar a compensação do destino pela abjuração do amor, o castigo possível da vida que, vingativa, não lho dera mais. (re)Viu-o naquele dia na estação de Oeiras, ali mesmo à beira da vida familiar da Rita Blanco, chorara como criança abandonada quando ela o esclareceu que o melhor era acabar a relação amorosa. Mas deixou-o afinal ficar pela casa. Ao fim destas duas décadas mantém o urso dos abraços, que lhe oferecera para amainar as solidões e o arranhar da depressão.
E ainda há o livro que enviou uns natais mais tarde, de uma psicóloga, um romance, que se recusou a ler...No escritório há toda uma panóplia de gadgets, ursos, pratinhos com o nome dela, com corações, enfim, uma pirosice. Nas gavetas do móvel da sala estão os livros, sim do tamanho de livros, que ele fazia para ela, cheios de poemas, descrição ad infinitum sobre ela, sobre o amor por ela, sobre a profunda depressão do fim do amor dela.. Muitos postais de todos os tamanhos - tinha predileção pelas colagens -, também eles cheios de amores infindáveis. A vela de aroma de morango, em forma de coração gigante, ardeu só até metade. Quando chegou a esse ponto desatinou a pulsar realmente como um coração, o que a enterneceu e afligiu. Decidiu dar-lhe vida eterna, ali, junto à lareira. A última carta que leu dele, já a reviu em momentos de grande tristeza e desalento. É um hino à sua pessoa, nem percebe como mereceu tanto. Não mereceu certamente. Foi uma oferenda dos deuses. Agora não mais viu, ouviu, ou pressentiu sequer um amor. Enganos e desenganos, tudo rápido, sem perdas de tempo ou criação de memórias, tudo líquido, tudo insano, tudo em vão. Talvez, afinal, aquele tivesse sido o amor que a vida lhe ofereceu, mas ela, arrogante, não quis. Ele prosseguiu vida fora, não sem receber outras facadas do destino - tanto que nem conto. Parecia bem da última vez que lhe cuscou o Facebook. Sim, às vezes, com anos de intervalo, envia SMS a perguntar se ela está bem, ou a informar que passou perto da casa dela e se lembrou - "como poderia esquecer?!" Mas ela nem liga, a maior parte das vezes nem responde.
E, no entanto, durante dois anos não houve um dia em que ele não lhe telefonasse e entre as conversas do quotidiano lhe dissesse que a amava. Assustava-a frequentemente com surpresas nos CTT. Flores, livros escritos por ele, um enxoval, que ainda hoje guarda. Parecia lhe tudo muito faca e alguidar - aborrecia-se. Afinal não chegou a ver o último CD porque lhe doía a alma, porque ele lhe sangrava pelas mãos, porque o computador avariou, porque o seguinte tinha outro sistema...numa das limpezas à casa acabou no lixo.
Para contar esta história abriu a gaveta das memórias, leu apenas uma folha e desistiu. Já não se lembra onde estão os livros que ele escreveu. Já passou tanto tempo. Mas vai responder ao novo SMS.
Ela pensava-se amorosa. Ali está uma prova contrária. Talvez se tenha enganado ... Talvez seja uma danada de uma mulher tenaz, forjada no feminismo pós vinte cinco de abril, que se prometeu livre de prisão familiar, que jurou juntar as suas forças por si e pela mãe passiva e subjugada por um homem. Então está explicado.
Ele hoje é um político de sucesso!
Não exatamente. Há 3 anos, ela acometida por um complexo de culpa, telefonara-lhe de rompante, junto ao mar bravio, fustigada por uma nortada fria, de que se protegia com um ponderado casaco, dali mesmo lhe pedira perdão. Pretendia assim remediar a compensação do destino pela abjuração do amor, o castigo possível da vida que, vingativa, não lho dera mais. (re)Viu-o naquele dia na estação de Oeiras, ali mesmo à beira da vida familiar da Rita Blanco, chorara como criança abandonada quando ela o esclareceu que o melhor era acabar a relação amorosa. Mas deixou-o afinal ficar pela casa. Ao fim destas duas décadas mantém o urso dos abraços, que lhe oferecera para amainar as solidões e o arranhar da depressão.
E ainda há o livro que enviou uns natais mais tarde, de uma psicóloga, um romance, que se recusou a ler...No escritório há toda uma panóplia de gadgets, ursos, pratinhos com o nome dela, com corações, enfim, uma pirosice. Nas gavetas do móvel da sala estão os livros, sim do tamanho de livros, que ele fazia para ela, cheios de poemas, descrição ad infinitum sobre ela, sobre o amor por ela, sobre a profunda depressão do fim do amor dela.. Muitos postais de todos os tamanhos - tinha predileção pelas colagens -, também eles cheios de amores infindáveis. A vela de aroma de morango, em forma de coração gigante, ardeu só até metade. Quando chegou a esse ponto desatinou a pulsar realmente como um coração, o que a enterneceu e afligiu. Decidiu dar-lhe vida eterna, ali, junto à lareira. A última carta que leu dele, já a reviu em momentos de grande tristeza e desalento. É um hino à sua pessoa, nem percebe como mereceu tanto. Não mereceu certamente. Foi uma oferenda dos deuses. Agora não mais viu, ouviu, ou pressentiu sequer um amor. Enganos e desenganos, tudo rápido, sem perdas de tempo ou criação de memórias, tudo líquido, tudo insano, tudo em vão. Talvez, afinal, aquele tivesse sido o amor que a vida lhe ofereceu, mas ela, arrogante, não quis. Ele prosseguiu vida fora, não sem receber outras facadas do destino - tanto que nem conto. Parecia bem da última vez que lhe cuscou o Facebook. Sim, às vezes, com anos de intervalo, envia SMS a perguntar se ela está bem, ou a informar que passou perto da casa dela e se lembrou - "como poderia esquecer?!" Mas ela nem liga, a maior parte das vezes nem responde.
E, no entanto, durante dois anos não houve um dia em que ele não lhe telefonasse e entre as conversas do quotidiano lhe dissesse que a amava. Assustava-a frequentemente com surpresas nos CTT. Flores, livros escritos por ele, um enxoval, que ainda hoje guarda. Parecia lhe tudo muito faca e alguidar - aborrecia-se. Afinal não chegou a ver o último CD porque lhe doía a alma, porque ele lhe sangrava pelas mãos, porque o computador avariou, porque o seguinte tinha outro sistema...numa das limpezas à casa acabou no lixo.
Para contar esta história abriu a gaveta das memórias, leu apenas uma folha e desistiu. Já não se lembra onde estão os livros que ele escreveu. Já passou tanto tempo. Mas vai responder ao novo SMS.
Ela pensava-se amorosa. Ali está uma prova contrária. Talvez se tenha enganado ... Talvez seja uma danada de uma mulher tenaz, forjada no feminismo pós vinte cinco de abril, que se prometeu livre de prisão familiar, que jurou juntar as suas forças por si e pela mãe passiva e subjugada por um homem. Então está explicado.
Ele hoje é um político de sucesso!