A Ponte Pedonal sobre o Arnóia

Quem não passou já na pequena ponte pedonal sobre o rio Arnóia, junto ao cemitério, que permite um belo atalho na direção de A- dos- Francos?! Seja para trabalhos agrícolas, ou algum desvio a olhares curiosos, a pequena ponte tem a sua história.

E essa história está ligada à minha família.

O meu avô vivia da outra banda do rio e, como sabem os mais velhos, um dia o fluxo levou-o para a eternidade, ou apenas o trouxe de regresso para o cemitério ali ao lado: as voltas que se dá para chegar mais cedo aonde se estanca o tempo!...

A passagem sobre o rio - que no verão, nem ribeiro é -, mas no inverno se entusiasma mostrando-se viril, era um caminho de calhaus rolados, um pouco achatados, a tremelicar: um caminho precário!

Após o incidente dramático com o avô, o meu pai juntou-se ao Ti Arroz e ao Ti Manuel Ranicha e iniciaram o empreendimento da pequena ponte.

O pai tratou da compra do ferro, mais propriamente das duas linhas de elétrico, que na altura andava a ser desmantelado e era acumulado na estação de Santo Amaro, em Lisboa - comprou-o ao preço da chuva!- e pediu ao Ruizel, que transportava o tomate da produção da aldeia para os mercados lisboetas, para na volta da viagem, trazer as futuras vigas. O Aníbal foi o condutor. Tudo à borla, para ajudar a comunidade! A cooperativa das máquinas, contribuiu com a instalação das linhas com um trator, e criou-se um fundo financeiro, um crowdfunding local, com direito a contabilidade. O pessoal foi dando segundo as possibilidades, mas a média ficava pelos 100 escudos. Uns mais somíticos, outros mostrando a sua generosidade ou estatuto - o pai foi equilibrando as contribuições de modo a que não houvesse muitas disparidades.

O povo é complicado! E territorial!

Logo se trouxeram à baila que este pedacinho de terra é meu, e até o doo a troco de um certo pedação além, para a comunidade - só que os registos diziam que esse já tinha dono - e vai de esbrigalhar por este assunto e pelos do passado e já voavam roçadoras e se escondiam roçadoras e alguém levou mais do que outro e a ponte fez-se, mas a zanga permaneceu!

Ficou-lhe a faltar um corrimão, o que me levou tantas vezes a criticar a obra. Acrófoba como era, e não sem razão, pois se ao avô materno lhe aconteceu assim, o paterno deslizou para dentro de um lagar subterrâneo e lá se finou. As figuras que eu fiz! "Anda que não acontece nada!";" Dá uma corrida que nem notas"; "Vá lá! não vou ficar aqui o resto do dia a tua espera". Lá fui ensaiando umas estratégias, nunca sem um grande arrepio! Mas hoje soube o porquê de a ponte ter ficado desasada. A primeira tentativa de pôr um corrimão, falhou: ele caiu! A segunda, não valeria a pena, pois, mesmo ao lado, estavam a construir uma outra grande ponte, para carros e tudo, por onde passaria uma estrada. De novo, politiquices, sentido de propriedade e afins, levaram a conflitos e "a ponte do desenvolvimento do Painho", lá está, ainda hoje, a apontar para o céu, pois do outro lado alguém teve o poder de lhe tirar o chão! E mais não sei!

A ponte pequena é a que funciona! Estará ainda sem corrimão?!

Foi uma obra criada em comunidade, não sem atritos...Talvez por estas e por outras, não haja muitas iniciativas - este será um bom tema de reflexão para os painhenses.

Mas a história não acabou aqui. O ti Manel Amaro ficou amuado com o meu pai. Cinco anos mais tarde convidou-o para fazerem o totoloto juntos; noutra semana quis pagar-lhe uma cerveja! O meu pai, desconfiado, não aceitava, até que um mediador o esclareceu que o Manel Amaro tinha ficado a saber da sua inocência na luta da ponte. Perdoaram-se mutuamente e ficaram grandes amigos desde aí, e para sempre!


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