Um sonho prévio à guerra
Só para recordar, registo o que lembro. Na primeira parte, quase nada recordo, senão estar a conduzir por estradas confusas e a negociar caminhos com alguém. O que importa é que, ao recordar, me vieram à memória pedaços de outros sonhos, em viagens e lugares pormenorizados. Adiante, o que me incomodou foi a segunda parte do sonho! Chegámos à casa da Cris, que é no Douro: uma casa grande, porém sem a glória que eu imaginava. Passei de carro por ela e fiquei nos momentos seguintes, a recordá-la, mesmo dentro do sonho. Tinha uma pintura arenosa e irregular de um amarelo pálido, um telhado de telha canudo, rósea, um logradouro, e mantinha uma janela aberta, onde por entre as cortinas a esvoaçar, se escancaravam uma dúzia de fotos do filho de Cris, com deficiência, sorrindo. A cortina estava arredada para que bem se visse o melhor da casa: o filho! Sei que a casa tem piscina, mas depois de chegarmos, acoitámo-nos no primeiro piso, amedrontados, e que não foi possível sair, pois a ação que se desenrolava lá fora, era de terror. Dentro da casa, no piso térreo usado como arrumo, bastante desarrumado, ceávamos em piquenique, eu, o meu irmão e uma criança, uma menina talvez! E o nosso pai tinha saído. Corríamos grande perigo pois estávamos escondidos naquela casa, à revelia dos donos ausentes, que também estava a ser usada por um gangue perigoso - soubemos só depois de estarmos dependentes daquele esconderijo. Não sei de que nos escondíamos, mas eu defendia que saíssemos dali, o meu pai não permitia, o meu irmão encolhia os ombros e todos poderíamos ser torturados e mortos. Lembro-me de debater esse assunto com o meu irmão, sem conseguir influenciá-lo: estava convicto de que os gatunos, se viessem, não nos encontrariam - pensei que ele iria sugerir ocuparmos o piso de cima, o que não dava qualquer garantia! No piso onde estávamos, era fácil de ver uma bancada onde os gatunos estavam a montar, o que parecia ser, uma bomba! De momento, não estavam lá, não nos tínhamos cruzado, mas o perigo era evidente! Fora e dentro da casa. Eu estava apavorada e não percebia a irracionalidade de ficarmos ali, embora, evidentemente, não estivesse com a informação toda, pois haveria de haver um motivo forte para não sairmos. Achava a decisão irracional, até porque iríamos acoitarmo-nos por ali mesmo, entre a desarrumação e com o risco de regresso dos malfeitores. Consegui ir até ao terraço do piso mais alto, quando me apercebi da chegada do gangue. Escondi-me entre a roupa estendida e alguma tralha. Eles entraram na casa. Lá, aconteceu algo. A minha família conseguiu convencer os gatunos a voltar mais tarde e a não fazer uma chacina. Era inverosímil! Mas deitava a minha certeza por terra. Afinal eles conseguiam fazer milagres e eu era uma tonta alarmista. Fiquei muito perplexa e acordei.